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Pontagrossense moradora de Luxemburgo é a primeira vítima a curar do covid-19

18 de abril de 2020 - 11:55

A vítima do covid-19 relatou o seu drama, porem preferiu não se identificar.

Uma Pontagrossense, de 40 anos que mora em Luxemburgo na Europa, há mais de 10 anos, relatou o drama que viveu, após contrair o covid-19.

Os relatos abaixo descritos contêm os desabafos, anseios, medos e ambições, o dia-a-dia de uma paciente infectada com o Covid-19, internada num hospital de referência no Grão-Ducado do Luxemburgo.

Vamos chamar-lhe Esperança (nome fictício), pois esse foi o seu desejo. Esperança é uma mulher na casa dos 40 e poucos anos, casada, com filhos, residente no Luxemburgo há mais de uma década. Pede-nos anonimato, o qual é, obviamente, respeitado pelo LUX24, site que manteve contato com a mulher.

Apresentação

“Olá, eu sou a Esperança, sou casada, tenho filhos, vim para o Luxemburgo como muita gente, tentar ter uma vida melhor e tentar dar um futuro risonho aos meus filhos, estávamos a par do que se estava a passar e tomámos todas as precauções possíveis, no entanto…”

 O começo do pesadelo

“Comecei por ter dores de cabeça, não liguei, tomava algo e passava, depois de alguns dias comecei a ter mais cansaço com as mesmas tarefas que antes fazia sem me cansar, de seguida os sintomas agravaram-se, os calafrios e transpiração que sentia com base no conhecimento que tinha da doença começaram a inquietar-me, a tosse seca começou, em momentos que quando falava comecei a sentir falta de ar constante, decidi então ligar à minha médica assistente a pedir ajuda, ela por sua vez disse-me que me iria enviar por correio electrónico uma receita para ir fazer o teste do Covid-19”.

 O teste e o chão que foge debaixo dos pés

“Dois dias depois de ter recebido a receita para o teste, uma equipa de um laboratório de análises dirigiu-se a minha casa para me fazerem o teste, aquela cena ficará para sempre gravada nas nossas memórias… Mascarados irromperam pela nossa casa, via medo, angústia e sofrimento na cara dos meus, o nosso mundo cai nesse momento, não sabia se chorava ou se tentava aguentar, o que a gente via nos outros lados estavam a acontecer comigo”.

Positivo

“No mesmo dia recebi o resultado, POSITIVO, sim, estava infectada, os meus sintomas nesse momento não eram segundo os técnicos muito alarmantes, aconselharam a ficar em casa resguardada do resto da família. Mas, os sintomas agravaram-se nessa mesma noite, a falta de ar era mais frequente. Inquieto com a situação, no dia seguinte, o meu marido não quis mais esperar e levou-me às urgências do hospital no Kirchberg. Durante o percurso a minha vida passou toda pela minha cabeça, o que seria de mim, dos meus filhos, do meu marido…”

 A solidão e o silencio gelado

“Ao chegarmos [ao hospital] o segurança barrou-nos o acesso, informei que estava contaminada e a partir daí tive que seguir sozinha. Fizeram-me todas as análises possíveis, sempre com muita gente devidamente protegida à minha volta.

Nunca tanta gente esteve a ocupar-se de mim, mas nunca me senti tão sozinha neste mundo, foi como se estivessem a tirar-me o chão debaixo dos pés, de enfermeiro para enfermeiro, análises aqui, outras ali, fiz igualmente um scanner aos pulmões. Meteram-me numa sala isolada onde me disseram para aguardar, os segundos parecem horas, as horas parecem dias…

Após algum tempo ouvi alguém aproximar-se, a porta abre-se, entra um médico, penso eu, um conjunto de emoções apodera-se de mim, um misto de tudo e mais alguma coisa, num discurso directo e sem rodeios: “Os seus pulmões estão muito afectados e tem uma forte contaminação no sangue, vai ter de ficar internada”

Seguiu-se um silêncio gelado… O meu mundo caiu, os meus sonhos, o meu futuro, a minha família…”

 A vergonha

“Liguei para casa, não sabia bem o que deveria ou tinha que dizer, de seguida vieram-me buscar para me levarem para o meu quarto, passei por meio hospital. Notei que algumas pessoas noutras áreas do hospital por onde passei não estavam protegidas e que a qualquer momento eu poderia contaminá-las.

No elevador uma enfermeira e um rapaz da manutenção, depois noutro andar entram mais duas enfermeiras, até ao meu destino ainda entraram mais 3 pessoas no elevador. Com vergonha estava cabisbaixa, tossia contra a parede do elevador para tentar não contaminar ninguém, senti-me ninguém, com a alma vazia, não via o momento do elevador parar e poder sair daquele sufoco”

Quarto isolado com vista de Betão

“Cheguei finalmente ao quarto, tudo estava muito limpo, há luvas, gel desinfectante, material de diagnóstico, os caixotes do lixo com cores diferentes, rotulados como sendo para material contagiado e não.

FOTO: Esperança 

Tenho máscara para usar, mas disseram-me que enquanto estivesse sozinha no quarto poderia estar sem ela, somente quando entrasse outra pessoa deveria usá-la.

O contacto entre mim e o pessoal médico é o mínimo possível, quando entram falam comigo à distância estão devidamente protegidos.

Hoje a minha realidade é esta, a minha vida resume-se a isto, estar num quarto isolada, ter uma vista (para um muro) de betão, sou uma doente de risco, também tenho psoríase”

 Os pássaros e Deus

“Choro, estou só, penso no pior… Ouço a Natureza falar, o canto dos pássaros, o fim da tarde é o período do dia que mais me entristece, acalmo porque sinto a presença de Deus perto de mim. Só penso em poder sair daqui curada e estar perto da minha linda família, dos meus filhos e marido, estamos cá [no Luxemburgo] sozinhos, não temos ninguém”

 A prioridade

“Todos os dias a médica vem examinar-me, verifica a respiração, faço análises ao sangue, verificam a temperatura e o oxigénio no meu sangue. Disseram-me para ligar para casa para me trazerem roupas porque era possível que a minha estadia fosse prolongada.

Estou a ser bem atendida, não tenho previsões de alta hospitalar porque tenho que criar imunidade, estou a sentir-me um pouco melhor, ao menos melhor do que quando aqui cheguei, mas continuo com tosse e dores de cabeça.

Propuseram-me um tratamento mais eficaz, mas que poderia fazer alastrar a minha psoríase, eu nem pensei e respondi que sim, depois eu encarrego-me de tratar a psoríase com cremes e outros medicamentos.

A minha prioridade é fazer desaparecer este vírus de dentro de mim.”

 Acordei com mais esperança

“Penso em todas aquelas pessoas que não têm este tipo de atendimento, vejo imagens horrorosas nas notícias, começo a pensar no depois… Hoje acordei com mais Esperança, em voltar para a minha linda família, ser a mãe que amo ser, trabalhar e ajudar os mais necessitados, sem esperar nada em troca. Alguns dizem mesmo que me preocupo mais com os outros que comigo mesma”

Uma filha infectada

“Na minha família todos fizeram o teste. Tenho uma filha de tenra idade que também está infectada, mas que felizmente não tem sintomas. Está isolada no quarto dela, todos estão em casa de quarentena.

O Ministério da Saúde do Luxemburgo foi exemplar e enviou para a minha casa vários ‘kits’ com luvas, material de desinfecção e máscaras.”

 O abrandamento e a recuperação

Os dias passam, a minha infecção está a abrandar, mas ainda não me disseram quando poderei a voltar para casa.

Decidi deixar-vos o meu testemunho para vos alertar: Isto [Covid-19] não é uma gripe normal, cumpram as regras de quarentena. Apesar de tudo, eu tenho tido muita sorte, só quero sair daqui e voltar à minha vida e agarrar com força os meus…”

(A vida continua…)

FOTO: Esperança 

Ao fim de oito dias de hospitalização, Esperança continua doente, mas recebeu no dia (16 de Abril de 2020) alta hospitalar.

Esperança pode agora voltar para o lar, para a sua família, mas ainda terá um plano restrito de isolamento social durante os próximos sete dias…

TEXTO E FOTOS: Esperança autorizado pela vitima do covid-19/ Agora 1

Redação Agora1
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